Parte 5

A obscuridade envolvia a sala mas Francis Benett, entregado a um sonho semi-extático, nem sequer percebia. Mas, repentinamente, uma porta se abriu.

– Quem é? – disse, girando um comutador.

Imediatamente, por uma corrente elétrica produzida no éter, o ar se iluminou novamente.

– Ah! É você, doutor? – disse Francis Benett.

– Sou eu – respondeu o doutor Sam, que vinha fazer sua visita diária... da plano anual. – Como está?

– Bem.

– Tanto melhor... vejamos sua língua.

E observou-a com o microscópio.

– Bem... e seu pulso?

Mediu com um sismógrafo, muito parecido com os que registram as vibrações do solo.

– Excelente! E o apetite?

– Ah! O estômago...

– É, o estômago! Não anda muito bem! Envelheceu! Mas a cirurgia progrediu muito! Será necessário implantar-lhe um novo! Você sabe, temos estômagos de reserva, com garantia de dois anos...

– Veremos – respondeu Francis Benett. – Enquanto esperamos, doutor, acompanhe-me a jantar.

Durante o jantar, a comunicação fonotelefótica foi estabelecida com Paris. Desta vez, Edith Benett estava sentada à mesa e o jantar, intercalado com os gracejos do doutor Sam, foi fascinante. Logo assim que terminaram:

– Quando pensa em voltar a Universal City, minha querida Edith? – perguntou Francis Benett.

– Vou partir neste instante.

– Pelo tubo ou pelo aerotrem?

– Pelo tubo.

– Então estará aqui...?

– Às onze e cinquenta e nove da noite.

– Hora de Paris?

– Não, não! Hora de Universal City.

– Até logo, então, e, sobretudo, não perca o tubo.

Estes tubos submarinos, pelos quais se vinha da Europa em 295 minutos, eram preferíveis aos aerotrens, que só atingiam 1000 quilômetros por hora.

O doutor se retirou, depois de haver prometido regressar para assistir à ressurreição de seu colega Nathaniel Faithburn, e Francis Benett, querendo fechar as contas do dia, entrou em seu escritório. Era uma enorme operação, quando se trata de uma empresa cujos gastos diários alcançam os 800 mil dólares. Felizmente, os progressos da mecânica moderna facilitam perceptivelmente esse tipo de trabalho. Com ajuda do teclado-calculador elétrico, Francis Benett acabou sua tarefa em vinte e cinco minutos.

Já era hora. Apenas havia apertado a última tecla no aparelho totalizador, sua presença foi requisitada na sala de experimentos. Imediatamente dirigiu-se a ela e foi recebido por um numeroso cortejo de sábios, aos quais havia se unido o doutor Sam.

Ali está o corpo de Nathaniel Faithburn, em seu caixão, colocado sobre cavaletes no meio da sala.

Ativa-se o telefoto e o mundo inteiro pode ver as diversas fases da operação.

Abre-se o féretro... Todos olham para Nathaniel Faithburn. Parece uma múmia, amarelo, rígido, seco. Parece-se com a madeira. Submetem-no ao calor... À eletricidade... Nenhum resultado... Hipnotizam-no... Chamam-no... Nada pode vencer esse estado ultracataléptico.

– E então, doutor Sam? – pergunta Francis Benett.

O doutor Sam se inclina sobre o corpo, examina-o com a maior atenção... Introduz-lhe através de uma injeção hipodérmica algumas gotas do famoso elixir Brown-Séquard, que ainda está na moda... A múmia está mais mumificada do que nunca.

– Bem – responde o doutor Sam –, creio que a hibernação foi prolongada demais...

– E então?

– Então, Nathaniel Faithburn está morto.

– Morto?

– Tão morto quanto se pode estar!

– Pode dizer desde quando?

– “Desde quando”? – respondeu o doutor Sam. – Desde o momento em que teve a nefasta ideia de ser congelado por amor à ciência....

– Convenhamos – exclamou Francis Benett –, eis aqui um método que necessita ser aperfeiçoado!

– Aperfeiçoado é a palavra – respondeu o doutor Sam, enquanto a comissão científica de hibernação levava o seu cortejo fúnebre.

Francis Benett, seguido pelo doutor Sam, retornou a sua casa e, como parecia muito cansado depois de um dia tão atarefado, o médico aconselhou-lhe tomar um banho antes de se deitar.

– Tem razão, doutor... Assim me restabelecerei...

– Completamente, senhor Benett, e se deseja, vou pedir ao sair...

– Não é necessário, doutor. Há sempre um banho preparado na mansão e nem sequer tenho que preocupar-me em ir tomá-lo fora de casa. Veja, com apenas esse botão, a banheira por-se-á em movimento e você a verá apresentar-se com a água à temperatura de trinta e sete graus.

Francis Benett acabava de pressionar o botão. Um ruído surdo nasceu, inchou e cresceu... Logo, abriu-se uma das portas e a banheira apareceu, deslizando eletricamente sobre seus trilhos.

Céus! Enquanto o doutor Sam cobria o rosto, gritinhos de medo e espanto escapam da banheira...

Havendo chegado há meia hora à mansão pelo tubo transoceânico, a Sra. Benett estava dentro...


No dia seguinte, 26 de julho de 2889, o diretor do Earth Herald recomeçava sua ronda de vinte quilômetros através de suas oficinas e, à noite, quando operou seu totalizador, estimou os lucros daquele dia em duzentos e cinquenta mil dólares: cinquenta mil a mais do que na véspera.

Que boa ocupação a de jornalista no final do século vinte e nove!

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Traduzido e adaptado por Eduardo Weiland

Um comentário:

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